T Ó P I C O : Enigmas do florescimento do cafeeiro - Por Prof. José Donizeti Alves
Informações da Comunidade
Criado em: 28/06/2006
Tipo: Tema
Membros: 5250
Visitas: 27.723.779
Mediador: Sergio Parreiras Pereira
Comentários do Tópico
Enigmas do florescimento do cafeeiro - Por Prof. José Donizeti Alves
Autor: Leonardo Assad Aoun
1.454 visitas
1 comentários
Último comentário neste tópico em: 01/03/2023 16:29:33
Leonardo Assad Aoun comentou em: 01/03/2023 14:24
Enigmas do florescimento do cafeeiro - Por Prof. José Donizeti Alves
Das fases do florescimento do cafeeiro, a indução e diferenciação floral, que em termos práticos, marcam a transição de gemas indiferenciadas em estruturas reprodutivas, constituem-se, até o presente momento, em um dos maiores enigmas do cafeeiro. Os principais estudos sobre os estádios iniciais do florescimento do cafeeiro datam das décadas de 60 a 80 e para se ter uma ideia de sua complexidade, nenhum deles foi capaz de apontar, com precisão, qual(is) fator(es) é(são) responsável(is) para induzir gemas indiferenciadas ao estado reprodutivo.
O problema é que, o rearranjo no programa de desenvolvimento das gemas axilares com vista a produção de um primórdio floral no lugar de uma estrutura vegetativa, não responde a somente um estímulo específico ou isolado e sim, a um conjunto de fatores do ambiente e da própria planta, que interagem entre si, gerando diferentes respostas. Dificuldades de ordens práticas de campo, para isolar os efeitos individuais de cada um desses estímulos, aliadas ao fato do cafeeiro ser uma planta perene, com bienalidade de produção e com processo reprodutivo muito longo e sujeito a extremos climáticos, que vão de seca a encharcamento do solo, calor a geada, alta insolação a baixa luminosidade, são os principais entraves.
Além disso, em uma lavoura de café, as plantas são muito heterogêneas, o que implica em grandes áreas experimentais, que pelo seu tamanho, podem abrigar vários microclimas. Tudo isso aumenta o confundimento, que em termos estatísticos, representa uma variável que influencia tanto a variável dependente quanto a variável independente, causando uma associação que não se sustenta e como tal, não pode ser descrita em termos de correlações ou associações. Apesar de não conclusivos e controversos, estes estudos permitiram ampliar o conhecimento a respeito da reprodução do café.
Estudos morfológicos sobre as gemas axilares ajudaram a entender o processo como um todo. Em ambas as axilas foliares dos ramos laterais, normalmente são observadas uma sequência de 5-6 gemas denominadas seriadas. Estas gemas se formam sucessivamente, sendo a mais desenvolvida da série, gema G1, presente na posição proximal ao pecíolo e a mais tardia, G5 ou G6, distal a conexão do pecíolo (ver esquema abaixo).

O desenvolvimento de G2 a G6 revelou-se dependente e subordinado a G1 de modo que, a iniciação dessas gemas mais tardias, é posterior a da G1. As gemas G1 podem originar ramos laterais ou inflorescências, enquanto as demais (G2, G3, G4, G5 e G6), raramente geram ramos, podendo formar inflorescências, permanecerem indiferenciadas ou se diferenciarem mais tardiamente, depois de um longo processo de repouso.
A distinção entre gemas axilares vegetativa e reprodutiva só é possível pela análise histológica. Entretanto, olhos treinados, podem distinguir, com certa precisão, cada uma delas no campo. O ápice das gemas vegetativas tem o formato de um cone estreito enquanto as induzidas para a reprodução, são alargadas, com aspecto tubular. Na sequência do desenvolvimento, os primeiros indícios, mais fáceis de serem percebidos na transição para o estádio reprodutivo são: entumecimento, aumento de volume e recobrimento das gemas por uma cera. Em seguida, as gemas crescem e entram em dormência até a retomada do crescimento, após o que, os botões florais individuais já se encontram totalmente formados para a antese, com as chuvas.
Por ocasião do crescimento dos ramos, as gemas seriadas se formam na axila de cada folha (nó), segundo a sequência G1, G2 e assim sucessivamente. Por isso é comum a existência de gemas em diferentes estádios de desenvolvimento, que por sua vez, irão refletir no fenômeno de múltiplas floradas e desuniformidade na maturação dos frutos, uma vez que botões de uma única inflorescência não abrem no mesmo dia. Portanto, fica claro que a desuniformidade do florescimento e a maturação desigual dos frutos é causada, principalmente, pela dissincronia na indução, diferenciação e crescimento das gemas florais, formadas a partir das gemas G1 e G2.
No Brasil, gemas G1 e G2, por conta da maior idade cronológica, de maneira geral diferenciam-se até a segunda quinzena de março e estarão aptas a abrirem os botões em uma primeira ou segunda florada, no segundo semestre do mesmo ano. Já as gemas G3, G4, G5 e G6, por serem mais jovens, podem se diferenciar até junho e por isso, vão participar de um terceiro ou quarto surto de florescimento, contribuindo, em conjunto com as gemas G1 e G2, para a produção, ainda que com desigualdade de maturação dos frutos. Entretanto, é importante destacar que durante a dormência, gemas florais de diferentes estádios de desenvolvimento, notadamente aquelas mais próximas fisicamente de G1 e G2, podem se igualar, gerando botões que se abrem ao mesmo tempo. De todas as gemas da série, G1 e G2 são as mais ativas a diferenciação reprodutiva. Juntas elas participam majoritariamente da floração e frutificação, produzindo mais 80% das flores e frutos.
Alternativamente, G3, G4, G5 e G6 podem permanecer indiferenciadas, o que implica em um menor número de frutos na roseta (roseta banguela). A não diferenciação dessas gemas não impede, no entanto, que, em razão de um desequilíbrio climático, hormonal e/ou nutricional, elas sofram uma diferenciação muito tardia, no final do segundo semestre e venham a abrir florada em janeiro ou fevereiro do próximo ano. A consequência prática desse distúrbio fisiológico, é uma maturação de frutos extremamente desuniforme e, por conseguinte, uma maior janela de colheita com reflexos negativos na qualidade e nos custos de produção. Esse distúrbio fisiológico, dado a instabilidade do clima atual, está acontecendo com certa frequência e é fácil de ser verificado, pois essa florada tardia, se dá na porção do ramo com frutos em estádios avançados de crescimento.
Estudar os fatores que afetam a indução e diferenciação das gemas reprodutivas não é tarefa fácil. No entanto, essas pesquisas permitiram uma ampliação no conhecimento científico básico sobre o florescimento do café, contribuído para a solução de vários problemas na cafeicultura. Ainda que complexos, não restam dúvidas que a reprogramação da gemas no sentido reprodutivo, ocorre mediante sinais exógenos e endógenos que interagem entre si como: (i) encurtamento dos dias; (ii) menor insolação; (iii) ciclos curtos de chuva e estiagem; (iv) aumento da amplitude térmica com a diminuição da temperatura ao longo da madrugada e a mínima, próximo ao nascer do Sol, voltando a aumentar com o passar dia; (v) menor demanda dos frutos na fase de granação, disponibilizando mais nutrientes e carboidratos para as gemas; (vi) alto vigor das plantas, que de certa forma está associado à sanidade e nutrição das plantas bem como à bienalidade negativa no ano anterior, que em função de uma menor produção, disponibilizará maiores conteúdos de energia para a indução das gemas, gerando, uma próxima safra cheia; (vii) enfolhamento das plantas, entre outros.
Quando um evento qualquer está sujeito a muitas variáveis, sem a preponderância de uma sobre a outra, é alta a probabilidade de que o surgimento, ainda que independentes, de um ou mais estímulos, em determinada intensidade, frequência e duração possa vir a desencadear respostas. No caso do cafeeiro, parece que nem todas as variáveis, até então estudas e citadas acima, precisam estar presentes para desencadear a iniciação e diferenciação das gemas reprodutivas. Tanto é verdade que pesquisas tem mostrado que que 95% das gemas, (possivelmente G1 e G2), se diferenciam em estruturas reprodutivas. Isso garante, um grande número de botões para abrir na época da florada. Portanto, é importante ressaltar, que o cafeicultor não tem que se preocupar com essa fase do florescimento, uma vez que ele consegue controlar apenas algumas variáveis que dependem de um bom manejo.
Pelo exposto, o principal entrave do longo processo de florescimento do cafeeiro, se encontra nas fases de pré e pós florada. Qualquer problema nessa época, pode resultar em altíssimas perdas na produção de café, ainda que a indução e diferenciação tenham acontecido a contento. Ao mesmo tempo, manter os frutos nas plantas, com principal atenção nas fases de chumbinho e crescimento ativo é fundamental para o sucesso do empreendimento café.
Parte do que foi comentado neste texto, teve como base informações extraídas das dissertações de :
Nídia Majerowiscz Gouveia (1984). Estudo da diferenciação e crescimento de gemas florais de Coffea arabica L. observações sobre antese e maturação dos frutos.
Mariza Neves do Nascimento, (2006). Estudos de alguns eventos do florescimento do cafeeiro relacionados a fatores do ambiente.
Prof. José Donizeti Alves
FisioCafé Consultoria e Palestras Ltda
(35) 99200-6703
Visualizar |
| Comentar
|