T Ó P I C O : Metionina e etileno no florescimento do café: será que faz sentido? - Paulo Mazzafera
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Metionina e etileno no florescimento do café: será que faz sentido? - Paulo Mazzafera
Autor: Leonardo Assad Aoun
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Último comentário neste tópico em: 14/08/2025 21:31:31
Leonardo Assad Aoun comentou em: 14/08/2025 17:56
Metionina e etileno no florescimento do café: será que faz sentido? - Paulo Mazzafera (Unicamp)
Metionina e etileno no florescimento do café: será que faz sentido?
Prof. Paulo Mazzafera - Unicamp
Vi alguns vídeos e escritas na internet sobre o uso de metionina associada a hormônios para melhorar o florescimento do café. Digo melhorar porque não é claro se o objetivo é aumentar a florada ou uniformizar a florada. Basicamente os hormônios envolvidos nessas divulgações são citocinina, ácido giberélico (GA) e auxina, e indiretamente o etileno. Por que o etileno? Porque o aminoácido metionina é precursor de etileno. O papel dos três primeiros hormônios no desenvolvimento floral do café é bastante conhecido e nessa época do ano, principalmente GA. Enquanto o déficit hídrico e o frio reduzem o ácido abscísico (ABA é um inibidor do florescimento) nos botões florais, aumenta GA, que prepara as flores para o florescimento.
O etileno entra na história, acredito eu, por conta de um excelente trabalho publicado por um grupo de Lavras (https://doi.org/10.1007/s00344-024-11481-x). O trabalho original também pode ser acessado no repositório da UFLA (https://sip.prg.ufla.br/arquivos/php/bibliotecas/repositorio/download_documento/baixar_por_anosemestre_matricula.php?arquivo=20211_201811096). O trabalho mostra que 1MCP (1-metilciclopropeno) induz um pico de etileno nos botões florais, folhas e raízes. É importante primeiro definir o que é o 1MCP. Este composto sintético não inibe ou estimula diretamente a produção de etileno. Para que qualquer hormônio tenha efeito, ele precisa ser reconhecido por proteínas que ficam na membrana plasmática das células, que são chamadas de receptores. Assim, para o etileno ter atividade, ele precisa se ligar a estes receptores, que por sua vez induzirão mudanças internas nas células, que são características da ação do etileno. O que o 1MCP faz é se ligar nesses receptores, no lugar do etileno. Logo, o etileno deixa de ter ação. O que o grupo de Lavras observou é que ao aplicar o 1MCP existe um pico de liberação de etileno. Este fato já havia sido observado em outras plantas, mas foi minuciosamente estudado no café. Mas o que é esse pico? A planta interpreta que o nível de etileno caiu muito, pois o 1MCP se liga muito eficientemente aos receptores (tem afinidade 10 vezes maior) e aí produz TRANSITORIAMENTE o etileno. Ou seja, a planta tenta reestabelecer o nível normal de etileno.
O que o grupo de Lavras também observou com a aplicação do 1MCP, foi que as flores nos botões florais se desenvolveram, mesmo sem ter chovido (vejam a figura 2 do trabalho ou as figuras 4 e 5 do capítulo 2 da tese). Isso seria esperado, pois o etileno induz amadurecimento. Logo, as flores nos botões florais cresceram além dos poucos milímetros que tinham, atingindo a maturidade e abrindo. Mas é muito importante dizer que “o número de flores não aumentou”, nem o número de gemas. As mesmas figuras 2 e 4/5 mostram isto.
Minhas considerações vão em direção à cautela em relação à adoção de indutor de etileno na floração, que no caso pode ser o papel da metionina. O primeiro ponto é que no trabalho, após 12 dias da aplicação do 1MCP as flores abriram e, coincidentemente houve chuva logo após o dia 12. E se não houvesse? Haveria pegamento? Tanto a tese como o trabalho não trazem os dados de pegamento para o tratamento com o 1MCP e o controle (sem 1MCP). Apenas o percentual de flores abertas, que foi 100%. Além disso, a quantidade de metionina aplicada não oferece garantia da quantidade de etileno liberada (na verdade, nem sei se haveria liberação, já que nenhum trabalho mediu isso em café). Um pouco a mais de etileno liberado poderia induzir queda de folhas ou mesmo de flores.
A literatura é rica em mostrar que o etileno é um hormônio característico de amadurecimento e senescência. Seu envolvimento no florescimento seria via interação com outros hormônios, mas ainda assim sem ter qualquer controle. Além disso, se ele ainda sofre resistência por parte de alguns para controlar a maturação dos frutos, com a possibilidade de erro e derrubar folhas, porque mexer em algo tão importante como é o florescimento. E sobre a metionina, a literatura mostra que o uso exógeno dela mexe significativamente mais com o metabolismo de poliaminas, um outro tipo de hormônios em plantas, do que o etileno.
Concluo dizendo que nem sempre um estudo básico (nesse caso o excelente trabalho do grupo de Lavras), pode ser extrapolado de forma simples e direta para o campo. O ideal é sempre testar primeiro cientificamente.
Paulo Mazzafera - Unicamp
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