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T Ó P I C O : Café brasileiro é ameaçado pelo desmatamento que ele mesmo provoca

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Café brasileiro é ameaçado pelo desmatamento que ele mesmo provoca


Autor: Leonardo Assad Aoun

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Último comentário neste tópico em: 22/10/2025 18:56:37


Leonardo Assad Aoun comentou em: 22/10/2025 18:51

 

Café brasileiro é ameaçado pelo desmatamento que ele mesmo provoca

 

Um relatório inédito publicado nesta quarta-feira (22) revela os laços do cultivo de café com o desmatamento no Brasil. O cultivo do grão é a sexta maior causa do desmatamento global, e o Brasil, maior produtor mundial, é responsável por quase 40% da produção.

Por: RFI/Portal Terra

Um relatório inédito publicado nesta quarta-feira (22) revela os laços do cultivo de café com o desmatamento no Brasil. O cultivo do grão é a sexta maior causa do desmatamento global, e o Brasil, maior produtor mundial, é responsável por quase 40% da produção.

Simon Rozé, da RFI em Paris

Em menos de três semanas, o Brasil sediará a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. A COP30 acontecerá em Belém, na Amazônia, e o país pretende fazer das florestas uma questão central nesta reunião, em um momento em que o país busca combater o desmatamento. Mas enquanto a devastação associada à pecuária e à soja é bem documentada, o mesmo não ocorre com o café.

O estudo "Acorde e sinta o cheiro do desmatamento", obtido em primeira mão pela RFI na Europa, é publicado pela organização internacional Coffee Watch, baseada na Dinamarca. O relatório mostra o alto custo ambiental por trás deste sucesso comercial global do produto brasileiro.

Embora não atinja a escala do desmatamento associado à pecuária ou ao cultivo de soja, o desmatamento causado pelo café é significativo e está em alta, aponta a organização.

Entre 1990 e 2023, a área cultivada com café mais que dobrou, de 0,6 para 1,23 milhão de hectares. Esse crescimento contribuiu para a destruição de uma das florestas mais ricas e ameaçadas do planeta: a Mata Atlântica, que chegou a cobrir 1,2 milhão de quilômetros quadrados de terras no Brasil. Hoje, restam apenas 10% deste número.

Área cultivada dobrou no Brasil
Mais recentemente, entre 2001 e 2023, o cultivo do café "destruiu uma área de floresta equivalente à de Honduras", explica Etelle Higonnet, fundadora e diretora da Coffee Watch. Isso representa mais de 11 milhões de hectares de floresta que desapareceram nos municípios que mais plantam café.

Este dado abrange diversas realidades: enquanto o desmatamento diretamente ligado à mudança no uso da terra para plantações de café representa pouco mais de 300 mil hectares, este número também inclui o desmatamento que ocorreu em todas as propriedades cafeeiras, totalizando quase 740 mil hectares.

A atividade gera um desmatamento que é descrito como indireto, para a construção de estradas que cortam as florestas e a expansão urbana, que acompanha a atividade econômica. Por fim, o café também se beneficia do que às vezes é chamado de "lavagem de desmatamento": aproveita terras previamente desmatadas para outras atividades, ou seja, se beneficia da destruição que não causou diretamente.

Por meio de dados detalhados de satélite, a Coffee Watch chegou a essas estimativas, que são particularmente altas no estado de Minas Gerais, reduto histórico do café brasileiro. O sudeste do país se beneficia de condições geográficas ideais: uma combinação de terras de grande altitude, temperaturas e chuvas adequadas e solos ricos.

Café faz a chuva diminuir
A destruição florestal não é apenas uma perda ecológica, mas uma ameaça ao próprio setor. O relatório destaca o papel crucial das florestas, em particular da Amazônia, como "máquinas de chuva", regulando os ciclos hídricos por meio de "rios atmosféricos" que transportam umidade para o sudeste do Brasil.

Ao destruir esses sistemas hidrológicos regionais e locais, o desmatamento empurra as principais regiões produtoras de café para o calor e a seca. "Ao analisarmos isso cientificamente, podemos mostrar com muita precisão como o desmatamento para o café contribuiu para destruir o ciclo hidrológico da região", explica Etelle Higonnet. "Isso levou a secas e, em seguida, a crises na colheita. O café se tornou uma commodity canibal, que destruiu o próprio sistema do qual precisava."

Desde 2014, as anomalias na ocorrência de precipitações se tornaram a regra no cinturão cafeeiro. Graves secas, particularmente em 2014-2017, 2019-2020 e 2023, devastaram a produtividade. Somente em 2014, as chuvas em estados como Minas Gerais caíram até 50% abaixo do normal, durante os meses mais importantes para o desenvolvimento dos grãos.

Pressões econômicas e regulatórias
Essa instabilidade se traduz diretamente em picos de custos. Em 2023-2024, os preços subiram mais de 40%, o que expõe o setor a um grande risco a longo prazo. Modelos climáticos preveem que o Brasil poderá perder até dois terços de suas terras aptas ao cultivo de arábica até 2050, em um cenário de emissões moderadas de gases de efeito estufa.

Apesar dessas projeções alarmantes, existem poucos programas voltados para limitar o desmatamento relacionado ao café, e é quase certo que o café da manhã da grande maioria de seus consumidores no Brasil está ligada ao desmatamento, diz a Coffee Watch. Apesar de sua posição como a sexta maior causa de desmatamento global, "ele não recebe atenção", lamenta Etelle Higonnet, ressaltando que o óleo de palma, por exemplo, está no centro de diversos programas de "desmatamento zero".

Existem algumas certificações para café. Os cafés com o selo Smithsonian Bird-Friendly são certificados como livres de desmatamento, mas envolve apenas 1% de todo o café produzido. Os cafés certificados pela Rainforest Alliance também atendem a especificações exigentes, embora menos rigorosas que as do Smithsonian em termos ambientais, mas mais rígidas em critérios sociais.

A produção brasileira de café também enfrenta sérios problemas de direitos humanos, trabalho forçado e, às vezes, até mesmo condição análogas à escravidão em grandes propriedades. "As inspeções nas fazendas continuam mínimas", explica Etelle Higonnet.

"A autoridade fiscalizadora brasileira realizou verificações em apenas 0,1% delas e, só com isso, encontramos 3.700 pessoas em situações análogas à escravidão que foram libertadas", denuncia.

Outros selos, como orgânico ou de comércio justo, também não controlam o desmatamento. Uma das razões para essa situação é o fato de que "nenhum café certificado garante uma renda decente", continua Etelle Higonnet. Isso dificulta que os agricultores parem o desmatamento, devido à falta de alternativas remuneradas.

A resposta pode vir de marcos regulatórios. A União Europeia está trabalhando em uma lei sobre desmatamento importado: uma lista completa de produtos, incluindo café, deve certificar que não são provenientes de terras desmatadas desde 2020 para entrar no mercado da UE. No entanto, sua entrada em vigor, inicialmente prevista para dezembro de 2024, foi adiada por um ano, antes de ser adiada novamente para 2026 sob pressão de muitos países, incluindo o Brasil.

O texto também deve ser "suavizado", de acordo com a Comissão Europeia na terça-feira (21), em um momento em que a legislação ambiental e climática da UE está sendo amenizada.

Sistema agroflorestal: bom exemplo, mas minoritário
Nesse cenário sombrio, há alguns bons exemplos, entre eles os sistemas agroflorestais com café. A prática é adotada por comunidades indígenas há centenas de anos, e reintegra as árvores às paisagens de cultivo de café, formando um "escudo natural" contra choques climáticos. As áreas sombreadas ajudam a reter a umidade do solo, reduzir as temperaturas e proteger as plantações.

As regiões da Zona da Mata, que têm uma tradição mais longa de agrofloresta, também demonstraram maior estabilidade da umidade do solo durante períodos de seca, como em 2021. No entanto, a adoção dessas práticas permanecem mínimas: em áreas-chave de produção, como Minas Gerais e São Paulo, menos de 1% da área cultivada é em sistema agroflorestal.

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